PÉROLA NEGRA

 Minha mãe sempre teve uns fiéis prestadores de serviço, com os quais acabava construindo uma relação de amizade, e eu passei a minha infância e adolescência convivendo com eles.


Zarife era uma mistura de pai árabe e mãe grega. Porte aristocrático, cultura invejável e uma vida digna de um Tim Tim, ou coisa parecida. Teve um atelier de alta costura em Paris, costurou para minha bisavó, para minha avó e para minha mãe, e nos 20 anos que antecederam sua morte - aos 103 anos - passava as semanas lá em casa. Foi o avô que não tive…


Salim Massoud Zarife foi campeão olímpico, na Antuérpia, da luta greco-romana. Foi amigo do pai da rainha Elizabeth. Foi estilista da esposa do JK. E terminou seus dias em Olaria, costurando fantasias de Carnaval.


Seu Wilson era pintor. Estava sempre lá em casa, já que a manutenção nunca tinha fim. Não sei se já faleceu, mas imagino que sim…


Zequinha era o piscineiro. Não trabalhava lá em casa, e sim na casa do Chico, um amigo, mas ia lá em casa limpar a piscina todas as manhãs. Levava bananas. Andávamos no mato com ele, que era conhecedor das frutas, dos bichos e das ervas medicinais da Mata Atlântica. Zequinha morreu atropelado e deixou saudades. Para muitos, era só maluco. Mas para a garotada da Gávea era como um Daniel Boone tupiniquim…


Mas por que essa introdução interessa? Porque teve o Luiz…


Seu Zezinho era lustrador de móveis. A garotada de hoje em dia nem sabe o que é isso. Um cara simples, que trabalhava assoviando e tinha a capacidade de vencer o crivo de minha mãe, que era muito crítica em relação a praticamente tudo acerca da decoração de sua casa.


Seu Zezinho costumava levar seu sobrinho, aprendiz de lustrador, mas que tinha mais interesse em música do que em lustrar qualquer coisa. Luiz era seu nome, menino negro, magrinho, inteligentíssimo, morador do São Carlos e de raro talento, que tinha uma banda, compunha suas músicas e tocava nos bares da vida. Isso era o final da década de 60, e eu era um bebê. Mas meus irmãos lembram bem do Luiz.


Em 1973 Luiz, gênio que era, lançou seu primeiro LP, Pérola Negra.


Sim, Luiz Melodia trabalhou com o tio em minha casa. Mais uma dessas histórias que eu conto e que todos duvidam, até que alguém com credibilidade comenta, e endossa.

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